11/07/2011

Carl Schmitt - Breve Introdução

por Paul Gottfried

Há duas ideias levantadas no trabalho de Schmitt que merecem atenção na nossa sociedade multicultural decretada pelas “elites”. Em «The Concept of the Political» (um trabalho que primeiramente surgiu em 1927 e que foi depois publicado em inglês, em 1976, pela Universidade de Rutgers) Schmitt explica que a distinção amigo/inimigo é uma característica necessária de todas as comunidades políticas. De facto, o que define o “político” por oposição a outras actividades humanas é a intensidade de sentimento em relação a amigos e inimigos, ou em relação aos nossos e àqueles percebidos como forasteiros hostis. 

Este sentimento não deixa de existir na ausência de Estados-nação. Schmitt argumenta que a distinção amigo/inimigo caracterizara as antigas comunidades e persistiria provavelmente no ambiente cada vez mais ideológico no qual os Estados-nação fossem enfraquecendo. O sistema europeu de Estados, a começar no final da guerra dos 30 anos, havia de facto prestado um serviço de controlo sobre o “político”.

O subsequente ataque a esse sistema de Estados-nação, com os seus específicos e limitados interesses geopolíticos, tornou o mundo ocidental mais fervorosamente político, um ponto que Schmitt desenvolve no seu magnum opus do pós-guerra «Nomos der Erde» (Nomos da Terra). A partir da Revolução Francesa cresceu o número de guerras travadas em nome de doutrinas morais – mais recentemente clamando a defesa dos “direitos humanos”. Essa tendência replicou os erros da idade das guerras religiosas. Transformou a força armada de meio para alcançar objectivos territoriais limitados, quando os recursos diplomáticos falham, numa cruzada pelo bem universal contra um inimigo diabolizado.

Uma ideia relacionada tratada por Schmitt é a tendência em direcção a um Estado Universal (a Nova Ordem Global?). Essa tendência parecia proximamente ligada à hegemonia anglo-americana, um tema que Schmitt abordou nos seus comentários durante e depois da II Guerra Mundial.

Os historiadores germânicos, no início do século XX, haviam tipicamente feito comparações entre, de um lado, a Alemanha e Esparta e, do outro lado, a Inglaterra (mais tarde os EUA) e Atenas – entre aquilo que viam como sendo potências terrestres disciplinadas e potências mercantis, expansionistas e navais. Os poderes anglo-americanos, que dependiam da capacidade naval, tinham um sentido de limitação territorial menor do que os Estados terrestres. As potências marítimas haviam evoluído para impérios, desde os atenienses.

Mas embora esta comparação seja controversa ele também levanta o ponto mais significativo: os americanos aspiram a um Estado Mundial porque reclamam validade universal para o seu modo de vida. Eles vêem a democracia liberal como algo que estão moralmente obrigados a exportar. São conduzidos pela ideologia como pela natureza do seu poder em direcção a uma distinção amigo/inimigo universal.

Embora nos anos 40 e 50 Schmitt esperasse que o devastado sistema de Estados-nação fosse substituído por um novo pluralismo político, a criação de esferas de controlo por parte de poderes regionais, ele também duvidava que isto resultasse. O período do pós-guerra trouxe a polarização entre o bloco comunista e os anti-comunistas, liderados pelos EUA. Schmitt claramente temia e detestava os comunistas mas também desconfiava do lado americano, por razões pessoais e analíticas. De Setembro de 1945 até Maio de 1947 Schmitt havia sido prisioneiro das forças de ocupação americanas na Alemanha. Embora libertado com base no facto de não ter desempenhado significativo papel enquanto ideólogo nazi, ficou traumatizado pela experiência. Durante o cativeiro fora-lhe “pedido” que desse provas da sua crença na democracia liberal. Ao contrário dos soviéticos, em cujas zonas de ocupação havia residido por um tempo, os americanos pareciam ser ideologicamente motivados e não meros conquistadores vingativos.

Schmitt acabou por recear o globalismo americano mais que o seu congénere soviético, que considerou ser despotismo militar primitivo aliado a uma obsessão intelectual ocidental. No final recebeu com agrado a bipolaridade da guerra-fria, vendo no poder soviético um meio de limitar as cruzadas americana pelos “direitos humanos”.

Um conhecedor crítico do expansionismo americano, Schmitt compreendeu o agora indisfarçável carácter ideológico da política americana.

No período posterior à guerra-fria, apesar da irritação que causa entre os imperialistas americanos, as suas análises parecem mais actuais e relevantes que nunca.