03/02/2012

A Escravidão do Consumo

Por Wellington Lisboa de Sena


Ao longo dos séculos o ser humano foi domesticado para viver dentro de um paradigma econômico totalmente equivocado. A pirâmide das necessidades de Maslow refrata inúmeras necessidades, das mais básicas até as mais sofisticadas, que segundo prega a moderna economia diz que o homem possui ilimitadas necessidades. Isso não é bem verdade. Terá o homem que trabalhar toda a vida para satisfazer “necessidades” aparentes em termos de bens e serviços? – Há pessoas que ocupavam elevados cargos da sociedade, eram enormemente bem pagas e tinham um status-quo absoluto quando abandonaram este tipo de vida e foram viver uma rotina totalmente diferente, seja no campo morando numa casinha rústica, seja numa praia isolada até sem linha telefônica. E estas pessoas, ao serem interpeladas sobre sua satisfação atual com o padrão de vida que deixaram e estão a viver, invariavelmente responderam que não se arrependeram nenhum pouco e que sentem-se até mais realizadas. Será que estas pessoas subiram a pirâmide das necessidades e desceram em sentindo inverso e, com essa atitude de vida, deixaram de serem felizes ou de viver plenamente?; A economia sempre pregou que os recursos (bens e serviços) são limitados enquanto que as necessidades humanas são ilimitadas. Desse pressuposto podemos concluir que uma economia baseada em dinheiro, instrumento utilizado para adquirir bens e serviços, será sempre uma doutrina onde haverá os mais beneficiados e os menos beneficiados, os incluídos, os excluídos, os que prosperam e os que, indiscutivelmente, sucumbem. E quem vai produzir estes bens e serviços? Os próprios consumidores, ou seja, o povo. Esse é um circuito medíocre mas bem interessante; o trabalhador, mau remunerado, trabalha todos os dias durantes os melhores 35 anos de sua vida para sua própria subsistência. Daí o estereótipo: “o homem é o que ele faz” (uma alusão à aparência social, o que veste e o que possui). Do valor em dinheiro que recebe ele utiliza para adquirir os bens e serviços que nas mais das vezes são mais valiosos do que o que ele produz (por exemplo: um funcionário de uma empresa de TV produz um aparelho de 32” que custa mais do ele recebe em termos monetários como salário mensal) e ainda terá que pagar imposto sobre a renda (descontados em folha), previdência social (descontado em folha), etc. além dos impostos sobre os bens e serviços que ele adquire.

Este é um ciclo infernal, aterrorizador e escravizante. Nossa geração que nasceu, cresceu e está a viver dentro deste paradigma de comportamento não tem a menor idéia do que é estar do lado de fora. Fomos, desde criança, ensinados pelos nossos pais a sempre obedecer nossos superiores, acatar ordens e seguir como cordeirinhos sem reclamar para não sermos punidos (pois há muitos desempregados que gostariam de estar em nosso lugar). A busca por um “lugar ao sol” e “estabilidade financeira” levam as pessoas a praticar coisas absurdas na vida em sociedade. A competição, a inveja, a acumulação de bens e determinados padrões sociais que são impostos acabam por escravizar completamente as pessoas, forçando-as a deixarem de ser “elas mesmas” no que de melhor elas têm como virtudes e vocação. E quando alcançamos o “emprego dos sonhos” continuamos sendo dependentes do sistema tão mais intensamente quando éramos jovens sonhadores sem compromisso. Sonhos que tínhamos na infância são paulatinamente massacrados e pulverizados no decorrer dos anos pela necessidade de “independência” que somos levados a ter numa sociedade puramente materialista, racional e estagnante. Mas voltando ao assunto das necessidades, gostaria de frisar um outro aspecto: a lei da escassez. A lei da escassez é uma lei férrea e incontornável, que reflete a natureza limitada dos meios disponíveis em relação aos fins que as pessoas tem em suas ações. A economia tem como fundamento o entendimento da noção de escassez. Tecnicamente, escassez é definida como o caso onde num preço nulo a oferta de um bem é menor do que a demanda. Um bem abundante é assim classificado quando num preço nulo sua oferta ainda é superior a procura. A escassez submete os homens ao seu jugo desde sempre, levando-os a se organizarem e a estabelecerem entre sí relações a fim de enfrentá-la ou, melhor falando, conviver com ela atenuando-lhe o quanto possível a severidade. A divisão do trabalho e todas as instituições de natureza economica surgiram para melhor alocar os meios escassos em relação a vários fins possíveis. Quando há escassez os agentes tem que decidir como alocar e usar estes recursos. Daí onde surgem as guerras. Quem governa determina aos “escravos” que lutem e deem suas vidas para a garantia da prosperidade dos “patrões” e a continuidade da economia reinante, com suas moedas, seus bancos e seu jugo escravizador.

A escassez esta intimamente relacionada com a lei da oferta e da procura. A escassez, assim como várias premissas do pensamento econômico dominante, são questionadas por autores como Hazel Henderson. A escassez é refutada em vista da inesgotabilidade da capacidade humana de produzir inovações tecnológicas e da utilização de energias renováveis. Há inúmeros recursos não escassos na natureza que poderiam melhor servir a toda humanidade e reutilizados eficazmente. Tal pressuposto é conveniente em particular para as teorias que priorizam a concorrência, a acumulação individual e a dominação. Talvez seja difícil imaginar uma sociedade sem o jugo escravizador do dinheiro, onde as pessoas ao invés de trabalhar durante anos para subsistência e aquisição de bens e serviços, pudesse produzir o melhor de sí para sua elevação moral, cultural e intelectual. Seria o caso de um artesão que fabrica peças de cerâmica que, vivendo numa sociedade livre de bancos, dinheiro em moeda e especulação, teria como destino o fruto de seu trabalho para trocar com outra pessoa ou mesmo presentear a uma pessoa conhecida ou parente. O horário de trabalho seria planejado conforme sua vontade, sobrando tempo para dedicar à educação dos filhos, por exemplo. Não haveria no mundo assaltos, pois todos poderiam viver tranquilamente sem necessidade de roubar do próximo; não haveria dívidas! Por que não teria a existência do dinheiro como elemento de troca; não haveria fome, pois os bens inesgotáveis da Terra seriam cultivados a tal ponto que a palavra de ordem seria “fartura” para todos; não haveria desemprego, pois todos poderiam trabalhar com mais ânimo de coração e felicidade, pois não haveriam empregados e sim colaboradores-patrões de seus próprios empreendimentos; não haveria guerras nem revolução, pois todos respeitariam o próximo como a sí mesmos e a riqueza seria distribuída de forma equânime. Talvez esse seja um mundo perfeito em teoria, caso não existissem a inveja, o egoísmo e a ambição características do ser humano. Mas isso poderia ser superado caso esta doutrina não tivesse sido levada à cabo por uma minoria que, séculos após séculos, através da força brutal e da lavagem cerebral (através da mídia controlada) vêm realizando nas gerações de pessoas de todos os países. Os que se levantam contra o sistema dominante são severamente dizimados (Jesus o foi, Gandhi, Martin Luter King, etc.) durante a história, também cheia de mentiras, que nos foi contada. Toda a nossa vida atual é muito mais ilusão do que realidade. Infelizmente somos joguetes de uma caricata vida social que não tem lógica. Como o próprio Jesus pronunciou em passagem dos evangelhos: “Daí a César o que é de César”. O dinheiro só tem valor para quem é escravo do dinheiro. É a força motriz deste paradigma cheio de engrenagens que é a economia. Sair dela é um lema impensado para muitos.


Retirado do blog parceiro Yrminsul.